ANDARILHO
- Gielton
- 8 de out. de 2019
- 2 min de leitura
Atualizado: 18 de ago.
Gielton

Quem é essa entidade que nos aprisiona? Ou nos liberta?
Anda sempre para frente, como quem mira uma meta tangível e persegue um fim atingível.
Para alguns, arrasta-se como uma tartaruga. Para outros, segue a passos largos de um gigante.
Não perdoa. Pode atropelar com o peso do “nunca mais” ou sussurrar com “ainda dá”. Mas, nunca, nunca pára — mesmo quando alguém em desespero grita: espera! Sua sina é seguir, descabelando os atrasados ou amparando os adiantados.
É abstrato, mas incorpora o real no simples transcorrer. Avança leve e constante como quem mede a estrada pelo próprio passo. Faz o dia virar noite salpicando alaranjado o horizonte. Pinta o ar de cinza enquanto as madrugadas tornam-se manhãs. Põe fim à dor. Simplesmente passa diluindo mágoas, curando feridas ou alinhando eixos.
Durante muito tempo competi com o tempo. Minha lógica cartesiana era ludibriá-lo com minha esperteza, em atalhos e desvios. Acordar pela manhã junto à queda do último grão de areia da ampulheta, era a meta. Atingiria, assim, o ápice do descanso para, em seguida, sair correndo como um atleta dos cem metros rasos.
Sentia-me vencedor.
Dono das próprias verdades.
Dono das próprias vaidades.
Desde que minhas primeiras rugas sintonizaram-se à maturidade, me tornei amigo do tempo. O escuto como quem ouve um vinil na vitrola e aprecia detalhes do encarte. Já não corro, caminho a seu lado sentindo os segundos repousarem sobre a palma da minha mão.
Aprendemos a nos respeitar. Entendemos juntos que basta estar. Basta sentir. Que cada instante é único e sem retorno. No entanto, logo adiante é permitido voltar e trocar as palavras, os gestos, os jeitos.
E neste afã, abrigar a mulher amada com o silêncio da escuta. Deixar a dor do outro penetrar em doses razoáveis. Viver a presença sem sombras nos calcanhares.
O tempo é um jardineiro que cultiva memórias e colhe despedidas. Me ensinou a plantar pausas, regar silêncios e colher amor. Se ontem foi carga pesada em meus ombros, hoje é vento que impulsiona meu veleiro.
Assim, a vida! No passo do tempo, encontro meu próprio ritmo.
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