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Gielton


Homem correndo contra o tempo




Hoje é feriado. Aí a gente pensa: o trânsito deve estar mais tranquilo. Podemos sair de casa sem grandes antecedências. Certo?


De fato, chegamos relativamente rápido. O frentista que nos atendeu na parada para abastecimento era lento toda vida. Quase girei a manivela da maquininha do cartão para acelerar o sinal. Não entendi: os estacionamentos da linha verde estavam lotados. Estranho! Ah, sim, o feriadão! Espero que haja vaga no aeroporto.


Esses minutos roubados ficarão para sempre. Calma, sem pânico, pensamento positivo: vai dar tudo certo! Só que o tempo, às vezes, nos pega por trás e, como um golpe de judô, quase nos nocauteia.


A cancela automática do estacionamento tinha que emperrar logo agora? Vixe, vou tentar o Premium, o dos magnatas. O quíntuplo do preço. Fazer o quê? Mesmo defeito. Que saco essa tecnologia. Sorte a nossa! A fila de carros era pequena quando a portinhola se abriu. Paramos na "casa do caralho" e caminhamos apressadamente. Calma, vai dar tempo!


A fila do raio-x estava gigantesca. Olhei aquela cobra em ziguezague de gente e intuí: vai faltar tempo. O embarque encerra em 10 minutos. Se eu tivesse um super Bonder aqui corria agora naquele relógio da parede e colava os ponteiros. Aí sim, ficariam agarradinhos no tempo. Agimos rápido. Passamos para a fila de prioridades e avançamos até seu início. Os primeiros autorizaram e passamos na frente de todos. Ufa!


O painel indicava portão 32, o penúltimo. Me senti na maratona. Fui no trote puxando a mala feito burro e carroça, desviando de pessoas, crianças e casais. Tentei ritmar a respiração mesmo com o joelho doendo levemente a cada impacto. Lembrei dos velhos tempos que corria 10 km com Zé Pequeno, nosso cão companheiro. Quem sabe o tempo volta!


Só percebi que não estava bem quando avistei a atendente. Bufava feito urso e mal conseguia falar. Minha mulher chegou logo em seguida com os bilhetes digitais e as mãos trêmulas ao celular. O QR Code quase pulou para fora da tela.


A porta do avião, ainda aberta, foi como a bandeirada de chegada. Mal tive força para encaixar as malas no compartimento e estatelei na poltrona.


Acredita que teve gente chegando depois da gente?


Assim a vida! Pregando peças sem aviso prévio.


 

Atualizado: 18 de abr. de 2024

Gielton


Linda mesa de café da manhã com pão integral





Tinha lá meus vinte e poucos anos quando formei minha primeira república. Éramos três e dividíamos uma casa. Um quarto para cada integrante. Os espaços coletivos eram compartilhados.


Eu e Jorge éramos vegetarianos. Juntos, preparávamos nosso próprio sustento usando alfaces, couves e manjericões retirados, no instante, da horta que cultivávamos no quintal. Produzíamos nosso exclusivo pão integral e nos deliciávamos em almoços às duas da tarde. Maravilhoso!


Mas, nem tudo são flores. O problema era a organização da cozinha. Depois do almoço, Jorge se recusava terminantemente a ajudar na lavação da louça. Entre fazer o trabalho sozinho e me submeter ao seu jeito de ser, subjuguei-me contrariado. "Tacávamos" tudo no tanque do lado de fora da casa após o almoço e nos enfiávamos cada um no seu dormitório.


Lecionávamos na mesma escola e, a pé, retornávamos juntos para casa depois do último sinal do turno da manhã. Embolados à criançada, rolávamos as ladeiras dos calçamentos históricos de Diamantina.


Só de pensar naquela "louçaiada" no tanque me dava calafrios de pânico ao abrir a porta de casa. De fato, a limpeza das vasilhas era feita a dois, assim como o almoço, mas o mau humor só me abandonava quando degustava a primeira garfada.


Muito tempo se passou e nesses longos anos me dediquei à minha profissão, à vida em família, viagens, cultura, amigos, lazer... Sinto-me privilegiado! Raramente cozinhei desde então. A jornada excessiva nos obrigou a contratar quem o fizesse por nós.


Hoje, aposentado, pesquiso receitas na Internet, compro os mantimentos e "meto" a mão massa. Essa semana fiz carne de sol fritinha (deixei o vegetarianismo) acompanhada de gratinado de batata e queijo com alecrim colhido do nosso pequeno terreno afastado da capital.


Sentei-me à mesa sozinho. Enquanto as cadelas espreguiçavam no chão frio para refrescar a quentura do dia, saboreei aquele momento para além das papilas gustativas. Viajei no tempo, as lembranças circularam, tracei linhas imaginárias em sequência como em uma película, deixei a alma flutuar levemente. Senti o prazer de cuidar de mim e agradeci, a cada garfada, por essa existência. Se há outras, não sei. Também, não importa.


Só para registrar: quase sempre lavo os pratos, panelas, tigelas e talheres logo que termino a refeição.


Assim, a vida! Ciclos que vão e vêm!


 
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Sala de aula dos anos 80






Estava com dezessete anos. As dimensões do amor eram infinitas e ilimitadas. Amava tudo e todos. Uma espécie de explosão da alma que reivindicava, ao mesmo tempo, justiça social e paixão individual. Um querer amplo e irrestrito. O anseio por intimidades desabrochava feito vulcão em erupção. Tudo meio misturado em uma sopa de desejos.


Que sorte a minha estar, nessa época, em sintonia com minha turma de escola, onde transitavam em mão dupla afetos para além dos muros e corredores. Ser parte desse grupo era uma forma, de estar e ser, de respirar com inspiração, de trocar sem vantagens, de crescer na medida do seu tempo.


Zuamos muito uns dos outros. Aporrinhávamos o ponto fraco de fulano, muitas vezes era eu mesmo, para depois largarmos! Uma espécie de bullying sem exageros. Sacaneávamos professores que não davam conta de si mesmos. Fizemos até greve de cantina para baixarem os preços dos salgados. Foi a glória! Enfrentamos diretores autoritários e disciplinários desajeitados.


Em véus de noiva acampamos! Fizemos música ao luar. Esquentamos fogo. Nos deleitamos em cachoeiras geladas e poços negros do rio Cipó. Em um desses fomos expulsos por invadir terras alheias. Imagina, quatro adolescentes com rabinho entre as pernas levantando acampamento diante de capangas armados?


O futebol era a marca da época. Times rivais permutavam vitórias e derrotas. Depois da pelada, cocas e guaranás eram compartilhados nos mesmos copos, sem rusgas dos pontapés dados ou recebidos. Aqueles que não se davam bem com a pelota, que não era o meu caso, sofriam seus quinze minutos de goleiro e olhe lá!


Éramos bons de notas, estudiosos e dedicados. Claro que colávamos. Mais para conferir do que para lucrar. Tínhamos orgulho de nós mesmos e ninguém queria manchar o nome de bobeira.


Ontem nos reencontramos depois que a linha do tempo percorreu mais de quarenta anos. Encontro para lavar a alma, deixá-la bem passada e pronta para seguir amando. Assim me senti!


Foi como um buraco no tempo. Mais do que relembrar histórias engraçadas e reviver no semblante de cada um, com seus trejeitos e tiques que permanecem, foi a sensação de estar lá quarenta anos antes. As lembranças foram se entrelaçando em sinapses elétricas e descarregando nos corações que palpitavam felizes pelo instante interminável. Dizem que o sentimento é atemporal. Eu confirmo.


O vínculo que formamos foi um laço tão forte que este reencontro ativou memórias afetivas guardadas nas nossas profundezas, que emergiram e foram expressas pelos sorrisos e abraços que nos demos, como se o ontem fosse agora.


Obrigado amigos de sempre!


 

Textos - Gielton e Lorene / Projeto gráfico - Dânia Lima

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