CAMPEONATO
- Gielton
- 12 de set. de 2019
- 3 min de leitura
Gielton

Campeonato? De que? Ora, foram muitos. De todos os tipos!!
Futebol, a toda hora. Afinal, tínhamos um campinho só nosso e podíamos jogar quando e quanto quiséssemos. Sendo mais novo que os meninos do bairro quase sempre ficava na "de fora". Assentado, fora do campo, à beira do barranco, assistia o entrelaçar dos pés descalços tocarem a pelota em vai e vem. Gooooool! Hora de levantar e tomar lugar no time para a próxima partida.
Agachados com a mão rente ao chão "tacávamos" a bolinha de gude. Ela caminhava lenta e sinuosamente pelo solo irregular até tocar a do adversário. Se caísse no papão, vitória!!! Mais uma que se juntava ao saco pessoal de bolinhas de vidro, prontas para serem disputadas no dia seguinte. O entardecer chamava para o indesejado banho. A vontade pedia um alongar da brincadeira, mas...
Em tempos de chuva a finca entrava em cena. A terra molhada e fofa era o palco da partida. Cada um com sua faquinha riscava o chão após enfincar sua ponta no solo. Contornar a casinha do adversário era a meta. Vez por outra, alguém ficava preso no emaranhado de riscos. Nesses momentos o "subite" era a única solução. Era doida essa jogada. E difícil!!! Dava muita polêmica. A finca deveria passar por baixo do traço de forma subterrânea.
- Não, ela não passou por baixo.
- Passou sim, olha a ponta dela do outro lado!
Quem concorda com quem? Éramos, nós mesmos, os juízes. Houve vez de resolvermos as divergências no "tapa".
Os ventos de agosto sopravam as cores para o céu azul. Tão limpo que os papagaios entravam no lugar das nuvens de algodão. Ripas de bambu cuidadosamente lapidadas davam a base. Papel de seda colorido, cortado na forma de losango, era colado à estrutura com linha de costura. Pronto, agora era só fazer a rabiola e prender o centro da base ao carretel. Aí era só soltar o "bichinho" que subia ao vento. Era dar linha para a alegria de conduzi-lo com "puxetas" para varrer o céu em manobras radicais.
Entretido na viagem espacial, às vezes, nem notava quando a criançada desenfreada corria atrás de alguma pipa abatida pelo cerol inimigo. Era emocionante derrubar o papagaio alheio dos bairros vizinhos.
Assim, vivíamos. de disputa em disputa. De amores ao ódio. Com amigos e adversários. Muitas outras brincadeiras rondaram nossa infância, como "mãe da rua", "polícia e ladrão", "queimada", "cuspe a distância", "carrinho de rolimã"... Um eterno aprendizado em lidar com a alegria das vitórias e as frustrações das derrotas.
Tinha uns quatorze quando nossa mesa de pingue-pongue foi instalada no porão de casa. A rua inteira ia lá jogar. Cada dia um adversário diferente. Sem contar, meu irmão. Ah, como treinamos!!! Ficamos bons na coisa. Além de nós, a dupla de irmãos Renato e Robinho também se destacavam.
Renato tinha um estilo mais agressivo com cortadas rasantes. Robinho era completamente oposto. Defendia muito bem. Pegava cada cortada de fazer raiva! Jogar contra ambos exigia habilidades diferentes. Leituras do adversário, estratégias momentâneas e muito reflexo!!! Às vezes ganhava, outras, perdia.
Fizemos muitos campeonatos. Um deles foi marcante. Todos da rua participaram. Era um sábado à tarde e, mesmo com o porão entupido de jovens e adolescentes, só se ouvia o quique da bolinha branca sobre a mesa. A cada vitória um a mais era eliminado até ficarem para as semifinais... Adivinha quem? Lógico, eu, meu irmão, Renato e Robinho. A disputa prometia. Ia ser acirrada!!! Dois sairiam da peleja e os outros dois ficariam. Bola de cá, raquetada de lá, defesa sensacional, cortada inesperada. A torcida se manifestava, nuuuu! Um bom narrador daria às partidas a emoção merecida. Eu era o mais novo de todos. Isso me dava um ponto negativo, pois tinha menos controle emocional, perdendo as estribeiras com mais facilidade e, lógico, errando bolas consideradas fáceis. Por outro lado, era ousado. Capaz de surpreender o adversário com jogadas inusitadas. A criançada toda lá, assistindo a final, depois de horas e horas de competição. Todos loucos para conhecer o vencedor do campeonato daquele sábado. Quem será? Quem terá sido?
Dizem que a memória é seletiva e confesso, sincera e honestamente, não me lembro do vencedor daquela disputa!!!
Assim, a vida. Memórias para que te quero.
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