NOITE DE AMOR
- Gielton
- 29 de out. de 2020
- 2 min de leitura
Atualizado: 10 de nov. de 2020
Gielton

A noite sem luar foi de cão! Semelhava uma dor desconhecida. Talvez até já tenha sentido antes, mas minhas reminiscências a apagaram. Só me restava empatia.
O choro era intermitente e se misturava a miúdas falas indecifráveis. Aparentemente inconsolável, o sofrimento emparelhava-se ao desespero. Talvez sentisse ódio por estar ali distante do aconchego cotidiano. Ainda não se habituara à distância. Por isso, não sabia o que fazer. Nem ele, nem nós.
Do quarto ao lado, aflito, eu ensaiava alguma reação, mas não sabia como, nem o quê. Assentei-me. Os pés encontram os chinelos pousados sobre a cerâmica. A estranha madrugada atordoava-me. O alvoroço da inquietude borbulhou dentro de mim. Qual atitude? Nada sabia.
Tropeçando no escuro e escorando nas paredes sólidas dei passos estrábicos em sua direção. Ele estava sonolento, mas de olhos descobertos em estado de espanto. Suas costas tangiam o colchão. De braços abertos ao lado do pai me viu na penumbra da porta. Disse em choro:
- Quero vovô.
Abriu os braços e aconchegou-se em meu colo. Meu braço esquerdo apoiou seu peso, enquanto o direito estreitava, peito a peito. Rapidamente sua cabeça acomodou-se em meus ombros. O choro incontido cessou e restaram soluços.
Minha energia veio em sussurros. Suave e firme. Calma e acolhedora. "José, sinto sua dor. Saudades da mamãe, né? Vontade de mamar? Pode deixar, vovô está aqui com você. Eu te ajudo. Conte comigo, com meu carinho, com meu amor. Não posso estancar sua tristeza, apenas aliviá-la, confortá-la."
Respirei fundo. O ar enchia os pulmões enquanto uma sombra translúcida nos envolvia. Uma profunda calma se abateu. Acomodamos um no outro. Sabia que éramos dois, mas tudo se passava como se fôssemos um só. O canal da paz se abriu.
José dormiu. Me senti amado.
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