A PERGUNTA QUE TRAVOU O CARRO
- Gielton
- 4 de jun. de 2020
- 3 min de leitura
Atualizado: 4 de jun.
Gielton
O menino só fez uma pergunta e congelou o carro todo. Olha só o que rolou?
Jovem, vinte e poucos anos, estudante universitário, resolve ser Uber recorrendo ao carro dos pais. Estes, apreensivos, colocam em seu embornal uma lista de prudências.
Horários definidos – somente durante o dia – além de regras estipuladas e negociadas, deram ao negócio (um empreendedor?) um ar de aparente brandura. Nos tempos atuais exigiram localização em tempo real pelo Google Maps, GPS, Whatsapp e os cambau!
O pai acompanhava, quando podia, as rotas e trajetos do velho carro. Quando lhe faltava Internet e a foto da cria permanecia algum tempo fixa no painel do celular, batia-lhe um frio na barriga. Pensamentos ruins são como chuchu na cerca, espalham-se numa velocidade atroz. Do córtex frontal atravessando o lóbulo esquerdo, as malditas sinapses induziam batimentos cardíacos acelerados até a atualização do aplicativo. Alívio!
Em casa, de volta da “uberância” do dia – nem sempre com o bom humor necessário – contava causos acontecidos. Tudo indicava uma rica experiência pessoal: conviver com gente, lidar com elas, sentir humores, odores e fragrâncias. Navegar por espaços desconhecidos, adentrar ruas nunca antes visitadas, aprender a ir e voltar. Atentar para os perigos e atrações ao dispor da vida…
Contou, certa vez, que entraram três passageiros: mãe, filho e filha.
A mãe, de aparência simples, trajava uma calça jeans. Tinha o cabelo preso atrás por uma gominha cor-de-rosa. Observou quando, ao sentar no banco de trás, se virou para ajeitar o cinto.
O filho, ainda criança, sentou-se ao seu lado. Tinha um olhar curioso. Sorvia o mundo em todos e por todos os sentidos. Inquieto, o motorista pôde perceber, pela ligação. Uma espécie de 220 volts alternado! Virava-se daqui, mexia ali, interrogava acolá. Girando a maçaneta, abriu o vidro e pôs o queixo para fora. Exclamou antes da partida: "viu o fusca bege, mãe?".
Quase ao mesmo tempo, a filha, ruiva e descolada, sentou-se à frente deixando à vista as tatuagens de animais no braço e o piercing entre as narinas. Deveria estar próxima dos dezesseis anos. A mini saia deixava suas magras coxas à vista. A sandália gasta deixava à mostra as unhas com esmaltes pretos e desgastados.
Logo após a partida, o garoto que estava vidrado na vitrine em frente pergunta:
— Mãe, o que é sexshop?
O condutor segurou o riso, fez para si uma cara de espanto e observou a expressão de desprezo, com um franzir de lábios, da passageira ao seu lado. Pôde ler seu pensamento. "Vê se pode, a pergunta desse pirralho!"
A mãe desconcertada, sem saber o que dizer, disfarçou em um silêncio que imobilizou todo o interior do automóvel..
Movendo os pés entre o acelerador e a embreagem o “uberista” arrancou. Como se esse andar da carruagem ativasse brechas no pensamento, o garoto repete.
— Mãeê, o que é um sexshop?
Diz ele – o motorista – que sentiu o aperto da mãe quando uma tosse seca, sem aviso prévio, saiu forçadamente de sua garganta. Não havia secreção e muito menos coriza...
Surpreendentemente a irmã reorienta o dorso para trás e diz:
— Carlinhos, sabe como é, né? As pessoas se apaixonam. Quando isso acontece, elas gostam de se presentear. Para isso serve o sexshop.
— Ah... Mas por que elas não compram no shopping normal?
A jovem, a essa altura, demonstrava sua sagacidade e perspicácia. O motorista já havia percebido. Ela continua:
— As peças vendidas em sexshop são íntimas de um casal e próprias para momentos de namoro, entendeu?
Em poucos segundos, a mudez se desfez novamente em um rompante de clareza.
— Ah, sim... Sexo Shopping - presentes para a hora de transar!!!
Assim, a vida. Como crescem rápido!
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