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Gielton


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Quando a luz submersa traz à tona tons de rosa em degradê. A Terra gira. A bola de fogo lança ondas de luz sobre as águas calmas. A alma flutua.

Bonecos de forte apache escondidos por trás de pedregulhos no quintal vizinho. Podiam se movimentar. Bastava um toque, de imaginação.

Perder-se no entorno das letras. Ir longe, longe no pensamento. Penetrar na história vagando pelos pontos e vírgulas da imaginação.

Deitar-se no chão duro do terraço. Na barriga, criança enjoada pedindo mãe. Cantar para o filete de Lua. Trazer consigo a paz.

A perfeição nas curvas tortas da silhueta da montanha no “entreclaro” do dia. Rabiscos de árvores contrastam com a distância daquilo que os olhos podem escutar.

Deixar doer. Fazer da dor um sentimento pequeno como deve ser. Tornar-se feliz. Por quanto tempo a alma suportar.

Colchões deitados. Siesta familiar. Pequeno encantador de almas a vagar...

De colorido branco, redonda como uma bola, cortando caminho, fazendo atalho no horizonte até se emparelhar no escuro céu noturno.

 
  • Foto do escritor: Gielton
    Gielton

Gielton



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Um sábado como qualquer outro? Só que não!

Aos poucos, a reunião começa. Escutei o portão se abrindo. Desci para ajudar. Trabalheira carregar tudo ao terceiro andar. Haja escada para subir e peso para sustentar.

Interfone:

- Oi mãe, seja bem vinda!

Interfone de novo. Dessa vez o genro com uma sacola. Nela, refri, suco e umas poucas latinhas de cerveja.

Gosto mesmo é de água com gás para acompanhar os queijos e queijos picotados sobre a tábua. O neto, não sei a quem puxou, come de boca boa qualquer um dos tipos.

As quatro bocas do fogão a todo vapor competem com às nossas bocas e línguas que não param de contar casos. Sorrisos a cada história repetida de anos e anos atrás.

Um banquete, ao modo realeza, é servido à mesa com requintes de crueldade aos de paladar aguçado. Quase como um mea-culpa à gula ativada a cada garfada. As papilas gustativas pululam como pipocas em meio à explosão de sabores. Tudo cuidadosamente preparado pela mulher da minha vida.

Restam-me os pratos e talheres sobre a pia. Confesso que não gosto muito, mas prefiro a ordem após a lavagem. Enquanto os escorredores ficam lotados e gotículas de água pingam lentamente, somos convidados a subir terraço acima.

Pensei, tenho que ser rápido. Quase terminei. Deixei algumas panelas para o filho mais novo. Mais do que justo. Para quem pouco ajuda no almoço, louças são as sobras.

A tarde estava muito quente mas, de quando em vez, soprava um ventinho de fazer inveja a qualquer ventilador. A siesta sobre colchões e tapetes esparramados pelo chão nos deram o conforto e relaxamento para brincar, conversar e rir.

Sogra e nora se empenham no cuidado com as plantas enquanto o neto se esbalda na piscininha debaixo da ducha. Bate pernas, esparrama água pelo chão. Tudo permitido. Passa pela sua motinha e aperta o botão para soar aquela música estridente e repetitiva que só ele curte.

Vez por outra, corre nos meus braços. Deita sobre a barriga e gargalha. Foi o centro das atenções e dos afetos desse sábado que deu seu ar da graça envolvendo a todos. Fortalecendo laços cuidadosamente cultivados ao longo de anos e anos.

Assim, a vida. Um brinde à família.

 

Atualizado: 3 de set.

Gielton




Folhas de plantas ao por do sol


Estive hoje em um velório. Caminhando sobre a grama, antes de alcançar o saguão, o bailado de uma folha me resvala o nariz. Segue sua dança como se tocar o chão fosse uma mera consequência. Este átimo da natureza trouxe consigo uma aura em forma de pensamentos: seria a morte arbitrária? É justa a vida?


Poxa, há tantos casais estranhos, que se esbarram em cada esquina, cujos olhares são como pontas de uma lança atingindo âmagos. Logo ele que, junto a ela, brilhavam em uníssono. Cantavam as mesmas notas em harmonia como o violino e o violoncelo. Partilhavam o fluxo com tanta leveza e profundidade.

A morte é um refletir-se sobre a vida. E se fosse comigo? E se fosse eu quem continuasse ou deixasse minha amada?


Talvez pediria como Noel Rosa.


"Não quero flores

nem coroa com espinhos

só quero choro de flauta

violão e cavaquinho"


Dei alguns passos para fora e aquietei-me em um canto. Encontrei um lugar onde meu corpo sofresse menos peso. Deixei as pálpebras caírem e os cílios, feito uma cortina de rendas, trazerem uma leve penumbra. É necessário tempo para sair de um mundo e entrar em outro. Aos poucos fui me deixando.


Os sentidos aguçados tornaram estrondosos os sons do hall. Um borbulhar de gente papeando. O perfume adocicado das coroas de flores se misturava ao cheiro do café. Um ranger de cadeira cortou o ar. Não havia notado até então os risos de encontros entre velhos amigos.

Mesmo assim, fui indo. Para dentro ou fora de mim? Nem sei…


Quando os ouvidos não mais distinguiam os sons em forma de matéria, escutei algo vindo da curva do pensamento.


“A película do filme da vida é translúcida. A visão não capta sentidos, apenas silhuetas. O essencial se esconde nos interstícios: no que se perde, no que não se pode nomear.”


Assim, a vida. Não se explica: atravessa.

 

Textos - Gielton e Lorene / Projeto gráfico - Dânia Lima

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