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CAVUCANDO A ALMA

  • Foto do escritor: Gielton
    Gielton
  • 28 de abr. de 2021
  • 2 min de leitura

Atualizado: 22 de out.

Gielton




Mãos e unhas sujas de terra



Você já pensou em quão fina é a raiz de um trauma?


Atualmente tenho passado horas a fio sentado sobre a grama. Queria tanto vê-la verdinha e vibrante. Assim como a vida que cresce em todas as direções, a relva feito uma teia, avança para os lados, para cima e para baixo. No entanto, há entremeios em que fica escassa, ressecada e sem pega. É quando a vida esmaece.


Sobre a relva, medito. Exercito a presença. Distancio pensamentos que se curvam além do tempo. Conecto-me à terra. Mãos pintadas de pó de chão até o sabugo das unhas. O eixo que me conecta à terra e à vida mantém ereta a coluna enquanto visualizo, uma a uma, as ervas daninhas.


De onde vêm? Por que se aglomeram e tomam conta? O gramado abandonado virou mato em algumas partes. Triste de ver... Vontade de reverter. As relações humanas se assemelham. Se descuidamos, tornam-se sarça. Perdem-se em si mesmas. Deixam-se dominar pela falsidade, pela aparência... É preciso catar uma a uma, dia após dia, cada tipo indesejado. Ainda assim, não há promessa. Nem permanência.


Com a ferramenta cutuco a terra. Há uma, tipo amendoim, que se embrenha entre as raízes da grama e alastra-se como um exército a conquistar novos territórios. É rasteira. Traiçoeira. Caminha distante sobre o capim. Invade, enlaça e sufoca.


Com a mão esquerda reúno os ramos emaranhados e espalhados sobre a superfície. Eles se aglutinam em um caule da espessura de um dedo. Preciso apalpar antes de cavucar. Guio com o indicador para encontrar o caminho da pega. Cuido para não machucar a grama. Afinal, as relações merecem cautela. Inevitável algum sofrimento.


Cavo fundo a terra em busca da origem: a causa dos desafetos, a semente dos traumas. É dali que vem a estirpe na seiva do bolo do barro.


A ferramenta é limitada. Não tem medida para alcançar o âmago. Então, arrisco esticar para cima, com as duas mãos, o talo da erva invasora . É preciso força e suavidade. Como na vida, nada se arranca aos turbilhões. Firme e convicto, intento extrair. Às vezes, sinto um descolar profundo. Ela ascende: uma raiz tão fina na ponta quanto um fio de cabelo. Tão frágil e devastadora. A sensação é de vitória sobre a maldade da erva funesta, sobre os encalhes da vida.


Outras vezes, escuto um estalo fino, como um "creque". É a raiz que se rompe e emerge pelas metades. Vem em forma de "aqui permanecerei e crescerei de novo". Frustro-me ao perceber que as pontas dos laços interpessoais retornarão em forma de novos desafios. Há muito a aprender sobre a terra, sobre a grama, sobre a vida.


Assim, centímetro a centímetro, trabalho arduamente, sem tempo para o término, pois o sol reaparecerá detrás das montanhas, iluminando um novo dia, transbordando esperanças de que o remexer as relações na terra sob a relva do dia anterior tenha valido a pena.


Assim, a vida! Cavoucar a alma com delicadeza e evoluir.

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Textos - Gielton e Lorene / Projeto gráfico - Dânia Lima

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