MISTÉRIOS DO LIVRO AZUL 5|14 — DOMINGÕES
- Gielton
- 29 de out. de 2023
- 2 min de leitura
Atualizado: 29 de nov. de 2023
Gielton

Em meio à confusão armada ele ouvia uma vozinha ao pé de ouvido: "abra uma latinha mais". Obedecia em um movimento quase involuntário, mesmo que o copo estivesse ainda cheio. De lata em lata, de copo em copo, de briga em briga, venciam o dia.
O ritual da dupla ia até a refeição entardecida e uma inevitável soneca. A zoeira se misturava aos sonhos estranhos de parcas lembranças. Acontecia uma espécie de apagar desgovernado quando não se percebia o limite entre o antes e o depois. O mundo virava ao avesso e desconhecia o que era frente ou verso.
O gosto de guarda-chuva na boca ao acordar era rebatido com outras três ou quatro birras a noite. Entre filmes e telejornais, solitário permanecia. Nunca fora de botecos e preferia esse alcoolismo ordinário em sua morada.
Muitas vezes Clarisse dormia enquanto Moacir assistia a filmes de todos os estilos e qualidades na TV. Varava madrugadas afundado no sofá, ouvindo tiros, acompanhando perseguições ou decifrando tramas. Era a sua forma de deixar a mente vazia, o que, na real, não ocorria.
O domingo era ainda mais intenso. O retardar ainda maior do almoço, feito a quatro mãos, era a forma encontrada pelo casal de suprimir — pelo menos assim achavam — o tédio daquilo que antecedia a segunda-feira. Banquetes regados a uma boa dose de álcool, correndo das veias ao cérebro, davam a sensação de torpor a que se acostumara. A noite terminava com os gols do Fantástico. Tinham ambos, ainda bem, o mesmo time do coração. Eram devotos torcedores — alguns dizem sofredores — do Clube Atlético Mineiro. Era o prenúncio de mais um dia de trabalho.
<Imagem gerada por Inteligência Artificial>
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