O VERBO
- Gielton
- 12 de jul. de 2023
- 2 min de leitura
Gielton

O tempo transcorre. Segue seu rumo ritmado sem olhar para trás. Não quer nem saber se sou eu ou você. Está acima de nós, apesar de caminhar ao nosso lado. Pulsa no pulso...
Há quem pense que ele pode se curvar nas dimensões do espaço. Distorce, alonga, encurta. Dobra-se sobre si e "prega peça" nos desatentos. Assim, é de cada um na medida do fluir.
O menino escorregou como quiabo. Desceu das entranhas sorrindo! Era como se o mundo fosse um velho conhecido. Um bebê sabido das relações. Muito mais do que simpatia. Algo de dentro, de uma comunicação para além das palavras.
Aquela criança cativava pela silhueta da alma. Dizia tudo sem palavras. Pedia, ordenava, reclamava. A língua embaralhava sons monossílabos. Pá, era papá. Pé, pega. Dá era dá mesmo.
Os contornos do corpo diziam também. O indicador apontava, os dedos em movimento circulares nos fazia aproximar, a mão fechada proferia a raiva.
O olhar comunicava a quem quer que fosse. Desde o mais íntimo ao caixa da padaria. O rastro por onde passava exalava magia.
Ah, o tempo! Os aflitos diziam: leve esse menino ao fonoaudiólogo, já passou da hora de falar. Outros mais comedidos gentilmente questionavam:
será que o tempo dele se comunicar com palavras além de sílabas e gestos já não virou a esquina?
Nós, os pais, transbordávamos em dúvidas. Receio de passar do tempo, de vacilar na decisão, de chegarmos atrasados e o relógio se cansar da espera. Escorria incertezas como leite derramado.
Até que... veio a caxumba! Preocupados, cuidamos. A febre ardente atormentava. Abraçamos o temor. Ai, ai, ai meu Deus! De repente, uma encefalite instaurou-se e os devaneios vieram em frases inteiras com sujeito, verbo e predicado. No meio da doença conjugou perfeitamente até no pretérito do passado. Foi como se a feitiçaria do tempo com um toque de condão fizesse seu trabalho revelando o inesperado. Embasbacados, quase não críamos.
No tempo de cada um a vida se encarrega da forma e do conteúdo. Hoje, o adulto expressa sua sabedoria do humano, aprendida de tantas outras vidas, em ações de afeto explícito por palavras bem ditas de amor.
Assim, a vida! O sino do tempo badala a nota que ressoa em cada um.
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